Eis a minha questão nefrálgica: será mais nobre
Na preguiça de levantar da cama quentinha sofrer as pontadas
Com que a bexiga cheia e enfurecida me alveja,
Ou insurgir-me contra um mar úrico de provações
E, sem luta, pôr fim à vontade de fazer xixi? Dormir: não mais.
Dizer que acabei com uma corrida ao banheiro a angústia
E as mil pelejas naturais - herança da mulher grávida:
Expelir para dormir... é uma consumação
Que bem merece e desejo com fervor.
Dormir... Talvez sonhar: eis onde surge o obstáculo:
Pois quando livre do líquido excrementício,
Novamente no repouso do leito o sonho que eu tenha
Deve fazer-me hesitar: eis a suspeita
Que impõe tão curta vida ao meu fluido renal.
Quem sofreria as incontinências de esforço,
O agravo do cálculo, a afronta das nefropatias,
Todos os tormentos de uma infecção urinária,
As delongas nas filas para os banheiros públicos,
As piadas que dos amigos nulos tenho de suportar
O mérito paciente, quem o sofreria,
Quando alcançaria a mais perfeita quitação
Disfarçada atrás de uma moita? Quem levantaria peso,
Gemendo e suando sob a vida pós-parto,
Se o receio de alguma coisa da bexiga escapar,
–Essa região desconhecida cujos limites
Jamais mulher alguma conquistou de volta –
Não me pusesse a voar para uma confortável peça de louça?
O pensamento assim me acovarda, e assim
É que se cobre meu corpo aquecido
Com o frio da madrugada e muita melancolia;
E desde que me prendam tais cogitações,
Viagens de carro a destinos distantes
Desviam-se de rumo e cessam nos postos de gasolina
Para outro tipo de ação.
Baseado na tradução de Péricles Eugênio da Silva Ramos.
http://pt.wikipedia.org/wiki/Ser_ou_n%C3%A3o_ser
http://pt.wikipedia.org/wiki/Ser_ou_n%C3%A3o_ser
Nenhum comentário:
Postar um comentário