terça-feira, 4 de maio de 2010

Pequenos milagres

Toda vez que me sobra algum tempo para observar este pequeno ser vivo em constante crescimento, processo de aprendizagem e produção de fraldas sujas, acredito que Deus (brasileiro ou indiano) tenha se enganado com o endereço dos verdadeiros pais da minha filha. Acho que era para a vizinha do andar de baixo do edifício onde eu morava em Bangalore (que já devia estar tentando uma menina há algum tempo), pois não temos o perfil de progenitores. Na verdade, ela sequer foi planejada; simplesmente “apareceu” num teste de gravidez de farmácia e invadiu nossas vidas, sem me dar uma última oportunidade para eu me despedir das bebidas alcoólicas e cafeinadas.


No entanto, à medida que esse mesmo tempo passa e ficamos mais apegados à nossa Pequena, mais aumenta o meu medo de que aquele mesmo Deus nos encontre neste minúsculo vilarejo da Inglaterra e mande alguém à nossa porta para buscá-la de volta.

Até que ela começa a choramingar, enquanto estou ocupada recolhendo a roupa seca ou aprontando a janta, e (com ou sem seus imensos e irresistíveis olhos castalhos a me seguir) sou eu que tenho vontade de sair pela porta e não voltar mais...

Infelizmente, ela não veio com manual de instrução nem trouxe um saco extra de paciência para sua inexperiente mãe. E por Deus, se não fossem os pequenos milagres criados pelo Homem, minha existência na terra de Winston Churchill (sim, o lendário primeiro-ministro inglês nasceu aqui perto, em Woodstock, no palácio de Blenheim) seria insuportavelmente monótona. E não me refiro à descoberta do fogo, nem à invenção da roda ou ao último lançamento em smartphones, mas a um subestimado e quase obsoleto aparelho receptor de ondas herztianas, o rádio.

Graças a ele e à falta de qualquer outro tipo de tecnologia disponível e instalada em nossa casa, minhas horas são preenchidas com sons diferentes do choro da minha filha. Desde que sintonizei na BBC de Oxford, não me sinto tão solitária e passo as manhãs escutando a saudosa música da minha adolescência e o inglês mais claro e compreensível da ilha (não é coincidência que Sir Churchill tenha sido um excelente orador), enquanto preparo o almoço do marido ou as mamadeiras da Pequena.

Desde que as ondas da FM 95.2 e as vozes de Malcom Boyden e Louisa Hannan invadiram (desta vez com permissão) minha vida, tenho a chance de entender um pouco mais sobre as questões que preocupam os habitantes de Oxfordshire; de rir com os comentários dos apresentadores; de me chocar com as manchetes do noticiário; de simpatizar com a vitória do time de futebol local; de me emocionar com as estórias da comunidade.

Graças a um pequeno milagre do Homem, me sinto novamente parte de algo mais importante do que meus problemas domésticos e consigo apreciar o maior de todos os milagres que já invadiram minha vida: os imensos e irresistíveis olhos castalhos da minha filha a me seguir...
E o seu chorinho.

Para escutar a BBC de Oxford, visite o site: http://news.bbc.co.uk/local/oxford/hi/tv_and_radio/

3 comentários:

Dinda Su disse...

Gosto muito de ler teus textos !
Procuro todas as noite por eles.
Continua escrevendo . Bjos.

Anônimo disse...

Oi Nanda> Agora temos mais um ponto em comum. Eu sempre tive como companhia o rádio. Ele aplaca a solidão. Bjs.Eunara

Ana Dos Santos disse...

Continua escrevendo!