quarta-feira, 2 de junho de 2010

Caixinha de surpresas

Em 1690, o filósofo inglês John Locke lançou as bases do empirismo ao escrever sua tese epistemológica Tabula Rasa. Para ele, todas as pessoas vinham ao mundo sem trazer absolutamente nenhuma impressão ou conhecimento, como se fossem “folhas em branco”, prontas para serem preenchidas pela experiência, aprendidas através da tentativa e erro.


Na época, esses conceitos foram muito importantes para fundamentar a ideia da igualdade intrínseca entre os homens, mas as descobertas científicas na genética e comportamento humanos confinaram a obra de Locke para alguns capítulos da filosofia e do direito natural.

É claro que o entendimento sobre genes e cromossomas estavam muito à frente de seu tempo e seriam, no final do século XVII, apenas material para a literatura gótica de Mary Shelley. Mas se aquele inglês, estudante da Universidade de Oxford, tivesse prestado um pouco mais de atenção no desenvolvimento dos próprios filhos, a História, provavelmente, teria sido escrita de outra maneira...

Pois como ignorar o papel da cultura no aprendizado? E como explicar que duas crianças, criadas pelos mesmos pais e no mesmo ambiente, tenham personalidades diferentes?

Atualmente, há dezenas de teorias e Escolas de Psicologia que tentam retificar tal erro.

Aqui em casa, é a minha Pequena que prova constantemente que o filósofo de Sommerset deixou escapar algo em sua tese. Com pouco menos de 7 meses de vida, ela me surpreende com sua curiosidade inata e, ainda que esteja na fase da “não-permanência do objeto”, ela se estica do carrinho à procura dos brinquedos derrubados no chão.
E mesmo tendo me tornado uma mãe-coruja, só posso classificar de inteligente o ato de ela se segurar na banheira para não escorregar, agora que está aprendendo a se sentar sozinha; ou quando encosta apenas a ponta da língua antes de comer as papinhas, como se quisesse ter a certeza de que a refeição é palatável; ou na hora de dormir, ao puxar a coberta e guspir a chupeta com um sorriso que diz que ela ainda não está com sono.

Não, Mister Locke, os bebês não chegam a este mundo como “folhas em branco”. A minha, pelo menos, já veio com uns rabiscos em punjabi e português. Mas continuo acreditando que a expressão mais apropriada para conceituá-la seja a de uma linda e adorável caixinha de surpresas.

2 comentários:

Anônimo disse...

Adorável é este teu texto! Quem disse que não se escreve bem quando estamos felizes?
kisses

Ana Dos Santos disse...

eles já nascem com personalidade!