quinta-feira, 1 de abril de 2010

Bad things come in threes

A primeira vez foi pura falta de atenção. Já tinha ouvido falar das inúmeras estórias de assédio na Índia, pelas intercambistas. Eu sabia até me defender na língua local! Mas estava tão concentrada em atravessar aquela movimentada rodovia que separava o escritório da ONG do meu apartamento que não consegui antecipar a situação.


Lá estava eu, a meio caminho do outro lado da estrada, em pé no canteiro central e esperando o momento certo para cruzar em segurança, quando ouvi um som abafado e senti uma palmada no lado esquerdo da bunda. Depois de recuperar o equilíbrio, pude ver o motorista com ar vitorioso e metade do corpo para fora do carro. Nunca mais me destraí no trânsito. E por mais que tivesse memorizado o tal palavrão em kannada, as palavras de xingamento só saíam em português. Eu precisava me acalmar, primeiro, e de mais treino, depois, pois minha intuição me dizia que algo parecido poderia se repetir.

A segunda vez foi praticamente um convite. Estava voltando de uma viagem curta a um dos projetos da ONG, num ônibus intermunicipal, à noite e sozinha. Eu era a única estrangeira; na verdade, a única mulher naquela sombria sucata ambulante.
Estava sentada à janela, com os braços esticados no banco da frente e contando os minutos que faltavam para chegar em Bangalore, quando comecei a sentir algo perto da minha axila esquerda. Não dei muita importância, porque achei que fosse minha dupata (lenço indiano comprido para esconder a forma dos seios) esvoaçando ao vento da janela aberta. Depois de alguns minutos, senti de novo. Virei a cabeça e me deparei com uma mão estranha avançando em direção ao meu peito. Dessa vez, consegui articular as palavras em inglês. Só não pude fazer um escândalo, já que estava em franca minoria e não queria incitar mais ninguém no ônibus. Nunca mais viajei depois de escurecer.

A terceira vez foi um sentimento de falsa segurança aliado à exagerada autoconfiança. Estava há mais de três anos na Índia e já me sentia com conhecimento de causa quando o assunto era assédio. Para economizar umas rúpias e minha paciência de outra viagem num rickshaw, e queimar algumas calorias, decidi caminhar os 5 quilômetros que separam o centro da cidade do meu apartamento. Não deviam ser duas horas da tarde e eu ainda estava no trecho “nobre” do caminho, quando um grupo de homens passavam por mim e um deles passou a mão em mim. Que cena! Só faltou a polícia e algo nas mãos pra acertar no engraçadinho, já que meus gritos conseguiram juntar uma considerável multidão. Nunca mais sai de casa sem um guarda-chuvas, mesmo na estação da seca: um instrumento perfeitamente legal e extremamente barato para auto-defesa.

Nenhum comentário: