Já estou numa idade em que sou mais do que responsável pelas minhas escolhas. Mas certos acontecimentos na minha infância e, até recentemente, influenciaram definitivamente na formação da minha personalidade e quero dividir com algumas pessoas essa responsabilidade.
Uma delas é meu pai e suas viagens para o exterior. Lembro de pequena, em Recife, escutar histórias e ver fotos de lugares distantes que o meu velho visitava a trabalho. Foi aí que nasceu minha vontade de ver o que ele tinha visto e, no primeiro intercâmbio para a Alemanha, fazia questão de parar, ainda que brevemente nas estações de trem, pelas cidades onde ele tinha deixado pegadas.
Mas a culpa não foi só dele, por eu ter me viciado nisso.
Sinto a dor do poeta pelas ruas (não de Porto Alegre, mas do mundo) que não andei... Sempre acho que o que procuro está um pouco mais à frente, na próxima esquina, na cidade vizinha... E quando, finalmente, chego lá, não era bem o que tinha esperava ou imaginava. Então, acabo seguindo adiante.
Mas tenho absoluta consciência que as minhas escolhas de hoje vão me trazer consequências no novo rasgar do dia. Levar uma vida de cigana, abandonar carreira e família e não ter um plano privado de aposentadoria, certamente não são as decisões mais sábias do mundo capitalista. Tudo o que tenho consigo acumular são rugas, cabelos brancos (inclusive púbicos) e estórias.
Mas esse é o sentido da minha vida: colecionar estórias. E procurar dividi-las, como uma boa jornalista, prematuramente aposentada. E as culpadas pela escolha da profissão foram minha prima e tia. Como filha mais velha, meu modelo mais próximo para me espelhar foi a Cris, e eu adorava receber cada pequena ou banal notícia sobre ela. Assim, ainda na Alemanha, quando a tia Sônia me escreveu uma carta (ainda na era pré-internet), sugerindo que eu fizesse jornalismo, foi na Cris que eu me inspirei.
Infelizmente, a profissao não era a mais acertada pra mim e descobri isso bem cedo, ainda na faculdade... O que fazer? O que sempre me deu prazer: mudar de país, me chocar com outras culturas, aprender outros idiomas e me encontrar com mães temporárias e hospedeiras.
A minha biológica, por sinal, também tem muita culpa no cartório. Ao sair de um estado de cancer mental (morrendo aos poucos numa profissão que detestava), para começar a fazer o que sempre quis aos 50 anos, ela se tornou meu exemplo vivo de que nunca é tarde pra nada! Assim, mesmo que fique errando (nos dois sentidos) por caminhos distantes, tenho a certeza de que sempre é possivel recomeçar (mais ainda quando se muda de cidade!).
Mas ainda vivo sob a impressão de ser a ovelha negra da família, a diferente, a do contra. Só não vou contra meu sonho: o de conhecer, ao máximo, o mundo. Não tenho respostas para os meus porquês. Só sei que a rotina me mata e que nenhum dos meus planos, a longo-prazo, dá certo. Tudo acontece inesperadamente e na última hora.
Por isso, assim como diz o poeta do samba, “deixo a vida me levar”. Prendo a respiração e mergulho nessa correnteza, com fé em algo superior e na esperança de continuar no caminho.
As mudanças de cidade, de emprego, de amigos e até namorados acontecem no momento certo e duram o tempo necessário. Doeu muito aprender isso. E dói ter que soltar as amarras afetivas, quando alguém especial sai da minha vida, desaparece do meu mapa geográfico (mas nunca emocional). E o culpado disso foi o brasileiro que me ensinou que, segurar demais uma pessoa ao seu lado, pode comprometer o crescimento de ambas. Vão-se os anéis, mas ficam as pegadas de um pedaço do caminho caminhado juntos.
Aonde meus pés e pernas estão me levando, não sei. Eles têm vida própria. eu só sei que, apesar de muitas vezes exausta da caminhada, das cãimbras, das bolhas e calos, gosto de olhar o horizonte limpo adiante e ver que ainda não cheguei ao final da estrada, que ainda há muitas trilhas para deixar minhas marcas.
Um comentário:
caminhante, o caminho se faz ao caminhar!
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